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Assim Estava Escrito (Vincente Minnelli, 1952)


GUILHERME W. MACHADO

"- Jonathan, will you marry me?- Not even a little bit."

Poucos filmes equilibraram com tanta proeza os encantos e as imperfeições da indústria cinematográfica de Hollywood como Assim Estava Escrito. Minnelli se vale de um apanhado de ironias e imoralidades para contar, sempre com elegância, a história de ascensão e decadência de um homem cujo "único" defeito era querer fazer os melhores filmes possíveis, independentemente dos danos emocionais causados nos envolvidos. Evidentemente que muito se esconde por trás da ambientação da indústria cinematográfica. Temas universais como ambição e paixão tem destaque na obra, dando-a uma substância (nesse caso, dramaticidade) necessária – coisa que uma história puramente irônica dificilmente terá, mas que aqui foi muito bem vinda.

Jonathan Shields (Kirk Douglas) é um ambicioso – e apaixonado – produtor de cinema que se encontra em baixa e precisa recuperar sua, outrora imensa, fama. Para isso ele convida três de seus antigos contribuintes que se tornaram estrelas: a atriz Georgia Lorrison (Lana Turner), o diretor Fred Amiel (Barry Sullivan) e o roteirista James Lee (Dick Powell). Após as primeiras recusas de todos, eles são chamados por um outro produtor, amigo dos três assim como companheiro de longa data de Shields, que reforça a proposta enquanto eles narram seus envolvimentos passados com o polêmico Shields.


"I've told you a hundred times. I don't want to win awards. Give me pictures that end with a kiss and black ink on the books."

O trabalho técnico do filme lhe soma diversos pontos. A fotografia e a direção de arte chamam a atenção sem cair na extravagância. Foi com muita precisão que Minnelli manejou sua câmera e se valeu de sua mais do que competente equipe técnica para fortalecer seu filme e não deixá-lo ser carregado pelo roteiro – que já é excelente por si só. A narrativa de tom clássico e feita, em sua maioria, através de flashbacks mantém o ritmo e alterna habilmente entre o drama e o sarcasmo, uma combinação difícil.

Sem dúvidas, um dos elementos mais importantes para o sucesso do filme foi o elenco. Principalmente Kirk Douglas. Robert McKee, mestre teórico de roteiros, afirma (em seu livro Story) que o protagonista de um filme deve ser “empático, podendo ou não ser simpático”. Penso em poucos exemplos tão bons para suportar esse frase quanto o personagem de Douglas nesse filme. Ainda que ele seja totalmente imoral e tenha todas as qualidades necessárias para ser um vilão, ele é um protagonista extremamente empático, tornando possível uma identificação, ainda que distante, com o público.

Minnelli certamente provou ser um diretor capaz de ir muito além de seus musicais. A forma como ele domina os elementos de seu filme (elenco, roteiro, equipe técnica...) e os alia a seu eficiente, ainda que não muito performático, jogo de câmera, dando ritmo a narrativa, é admirável. Minnelli dá vida a um mundo que vive no imaginário de muitos. Sem pudor ele desmascara os podres de Hollywood, mas a verdade, como ele mesmo acaba mostrando – conscientemente ou não –, é que muitos (para não dizer todos) trocariam suas vidas por aquelas que veem nas telas, com todos seus defeitos.


"Well, congratulations, you've got it all laid out for you so you can wallow in pity for yourself. The betrayed woman. The wounded doe with all the drivel that goes with it going through your mind right now. Oh, he doesn't love me at all. He was lying. All those lovely moments, those tender words. He's lying. He's cheap and cruel. Well, maybe I like Lilas. Maybe I like to be cheap once in a while! Maybe everyone does, or don't you remember?"

NOTA (4/5)

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