GUILHERME W. MACHADO
The crime you see now, it's hard to even take its measure. It's not that I'm afraid of it. I always knew you had to be willing to die to even do this job. But, I don't want to push my chips forward and go out and meet something I don't understand. A man would have to put his soul at hazard. He'd have to say, "O.K., I'll be part of this world”. (Xerife Ed Tom Bell, Onde os Fracos não têm Vez)
Fiquei impressionado, enquanto assistia Sicario: Terra de Ninguém no cinema, o quanto o novo filme
de Denis Villeneuve tem em comum com uma das obras-primas dos irmãos Coen: Onde os Fracos não têm Vez [2007]. Fora
a semelhança dos cenários e de membros da equipe envolvidos em ambos projetos
(Josh Brolin e Roger Deakins), são dois filmes marcados pela incontrolável
violência de um mundo moderno para o qual seus protagonistas ou não estão de
forma alguma preparados, ou já foram totalmente absorvidos pelo mesmo. Tendo
apontado isso, tranquilizo o leitor ao informar que não farei do meu texto um
quadro comparativo entre os dois filmes, e focarei apenas neste em questão.
Sicario é um filme lento, cadenciado e totalmente controlado
pelo pulso firme de um dos diretores mais consistentes da atualidade. Apesar de
toda questão rítmica e contemplativa que envolve o filme durante toda projeção,
ele é uma obra repleta de violência. Sua presença, ainda que não seja direta em
muitas cenas, é o que guia os personagens e suas ações, assim como o meio que
os absorve e transforma. O meio, por sinal, é um elemento central em Sicario. Villeneuve recorre frequentemente
à planos bem abertos, nos quais seus personagens são só um pequeno (em termos
de proporção visual, mas também metaforicamente) elemento no cenário. Além, claro, de explorar bastante a paisagem em planos lentos e atmosféricos, que vão nos
inserindo progressivamente dentro daquela ambientação.
A intensidade alcançada por Villeneuve com seu particular
estilo de filmagem, já apresentado nos bons Os Suspeitos [2013] e O Homem
Duplicado [2013], mas intensificado aqui, chega a ser palpável durante o
filme. Para tal há uma valiosa contribuição da excelente trilha sonora – digna de
premiação, deve-se mencionar – de Jóhann Jóhannsson, em tons graves que se assemelham aos feitos por
Trent Reznor (Garota Exemplar; Millennium: Os Homens que não Amavam as
Mulheres). O diretor de fotografia Roger Deakins também desempenha um papel
fundamental nessa imersiva construção atmosférica, utilizando uma paleta de
cores tipicamente desértica durante boa parte do filme, mas mostrando todo seu
talento em sequências como a do túnel, excepcionalmente filmada com o uso de planos
subjetivos de visão noturna, e também num
fantástico jogo de sombras à lá Gordon Willis (O Poderoso Chefão; Todos
Homens do Presidente) na reta final.
A violência pungente dessa tensa região fronteiriça
entre os Estados Unidos e o México, onde há anos é travada a chamada “guerra
contra o tráfico”, marca os personagens de forma definitiva, e pode ser sentida
através das ótimas atuações do elenco. Benicio Del Toro, principalmente, é o
próprio produto desse meio. Um fantasma, alguém que perdeu sua humanidade e tornou-se
um espectro de gente. Seu contraste com Emily Blunt, uma agente federal
invariavelmente correta que vive totalmente para o seu trabalho, é presente
desde o princípio, mas apenas ganha contornos definitivos na excelente
penúltima cena. O roteiro nos entrega maiores detalhes sobre os personagens
numa progressão sutil; vemos como são desde o início, mas somente os
compreendemos conforme recebemos mais informações sobre os mesmos.
Sicario traz o melhor do gênero policial na atualidade, constituindo-se também como um fortuito exercício de gênero. Já foi declarada
por Villeneuve sua intenção – que é evidente quando se olha para sua curta filmografia – de passar por diferentes gêneros, o que somente
aumenta a expectativa para a continuação de Blade
Runner sob sua direção, dessa vez na ficção científica.
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