Mais 40 anos de experiência deram ao piloto Sully a bagagem necessária para operar
o seu “milagre” – como foi proclamado – no rio Hudson no auge do inverno de
2009 em Nova York. Quase os mesmos 40 e poucos anos de experiência em direção
que permitiram a Clint Eastwood confeccionar seu filme mais enxuto (não apenas
por ser um dos menores de sua carreira) e preciso. Sully é mesmo, seja no seu enredo ou na execução, um filme de
precisão glacial, com um mínimo de floreios. O problema é que toda essa concisão,
que, garanto, foi meticulosamente articulada, faz com que o filme pareça
simplório ao olhar de alguns.
A frieza de uma Nova York em suas primeiras semanas de
janeiro (inverno pesado) é a mesma frieza emocional do piloto-título na situação de maior
pressão imaginável em sua profissão, e a mesma também aplicada por Clint no
retrato objetivo desse evento. Porque o filme é mesmo sobre pouco menos de 5 minutos
de ação que são repetidos, discutidos, reencenados e reimaginados ao longo de
96 minutos de filme. Não são os 40 anos de profissão, muito menos a história de
vida dessa figura heroica americana, que estão em análise; são 208 segundos, e
suas consequências.
Há todo um paralelo, difícil de sonegar num texto
desses, com o trabalho recente de Eastwood na desconstrução de figuras americanas
tidas como heroicas, mas que são, na verdade, humanos, com seus próprios problemas e vidas pessoais, cumprindo (bem, mal,
alienadamente, seja da maneira que for) suas funções/trabalhos. J. Edgar (2011), filme mais fraco dessa
fase, é o primeiro, seguido do mais profundo e ambicioso Sniper Americano (2014)
e agora por esse Sully (2016), que é
o mais distante e isento dos três. São, na verdade, obras que se completam, e juntas
oferecem um retrato notável não apenas do heróis estadunidenses, mas do próprio
país como nação. Tanto a mídia quanto o corporativismo presentes em Sully, por exemplo, não deixam de ser
parte de um comentário social, que, por mais que penda ao patriotismo – e algumas passagens não negam isso –, revela também os percalços do sistema.
Por mais fria que seja a execução de Sully, irrompe ainda a humanidade típica
dos filmes do diretor. Muito como em Hawks – diretor ao qual Clint é frequentemente
comparado – é a interação humana o centro da obra, e não as questões que
envolvem a máquina (bem diferente de, sei lá, um J.J Abrams). Não apenas o
esforço piloto/copiloto está em questão, mas também o de toda equipe de voo na
evacuação, dos 1200 oficiais nova-iorquinos envolvidos de alguma forma no resgate dos passageiros
no rio, e daí por diante.
As cenas de avião são homeopaticamente distribuídas ao
longo do filme, mas são de um realismo palpável. Não há todo exibicionismo
circense de um Robert Zemmeckis, mas Eastwood fez um bom trabalho nos colocando
naquela situação com os pilotos e demonstrando claramente para nós, leigos, de
quantas formas tudo poderia ter dado tragicamente errado, sem para isso precisar tornar-se didático sobre as questões técnicas de aviação (tudo é sobre o ser humano). A montagem brilha
nessa (re)construção episódica desse breve acontecimento e merece (como o
próprio filme) ser reconhecida nas premiações, que ainda não decidiram se vão
abraçar o filme ou ignorá-lo por completo.
NOTA (4/5)
Muito boa crítica, eu gostei do seu texto, sua análise é muito inteligente. Eu gostei do filme. Acho que os filmes de Clint Eastwood são cheios do seu estilo, e logo se pode identificar quem esta responsável pela direção. Faz pouco tempo que vi o filme Sully e fiquei encantado, esta muito bem feito e muitas das cenas que fazem são ótimas. Além, desfrutei muito deste filme pelo bom enredo e narrativa. Considero que a historia foi bem narrada pelo diretor. Acho que é um dos melhores filmes feito por ele.
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